REONERAÇÃO DA FOLHA DE SALÁRIOS – CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA

Medida Provisória que promove a reoneração da folha está pendente de apreciação no Congresso
por Enrico de Carpena Ferreira Correa de Barros publicado em 09/02/2024

Em 29/12/2023, foi publicada a Medida Provisória (MP) nº 1.202/23, que reestabelece a gradual reoneração da folha de salários para 17 (dezessete) setores empresariais, a partir de 01º/04/2023. Essa medida foi adotada pelo Governo Federal no mesmo dia em que publicada a Lei nº 14.784/23, a qual prorrogava a desoneração da folha de pagamento até 31/12/2027. Como se sabe, a (des)oneração da folha de pagamento é um tema que, historicamente, gera disputas econômicas e políticas, sobretudo no que diz respeito à efetividade da medida desonerativa para a geração e manutenção de empregos.

Desde 14/11/2011, o  art. 7º da Lei nº 12.546/11 previa a chamada desoneração da folha de salários específica para o setor de serviços de Tecnologia da Informação e Comunicação. Nesses casos, as empresas poderiam recolher, até 31/12/2014, a contribuição incidente sobre o valor da receita bruta (CPRB) no percentual de 2,5% (dois e meio por cento), em substituição à contribuição previdenciária de 20% (vinte por cento) incidente sobre o total das remunerações pagas, devidas ou creditadas (folha de salários), prevista no art. 22, incisos I e III, da Lei nº 8.212/91.

Posteriormente, essa previsão sofreu significativas modificações: (i) o prazo previsto na redação original foi gradativamente postergado até 31/12/2023; (ii) a desoneração foi ampliada, para contemplar outros setores produtivos (tais como as empresas dos setores de transporte rodoviário coletivo, metroferroviário e ferroviário de passageiros e do setor de construção civil e de obras de infraestrutura); (iii) as alíquotas da CPRB variaram de 2% (dois por cento) a 4,5% (quatro e meio por cento), a depender da atividade desenvolvida; e, (iv) a partir de 01º/12/2015, a substituição da contribuição previdenciária pela CPRB passou a ser facultativa. 

Em 06/07/2023, com o objetivo de prorrogar por mais 4 (quatro) anos o prazo de que trata o art. 7º da Lei nº 12.546/11, foi apresentado o Projeto de Lei (PL) nº 334/23. O PL previa alíquotas de 1% a 4,5% de CPRB em substituição à contribuição previdenciária, e, para compensar a diminuição de arrecadação fiscal, prorrogava-se o aumento em 1% da alíquota da Cofins-Importação até dezembro de 2027, prevista no art. 8º, § 21, da Lei nº 10.865/04.

A Presidência da República vetou integralmente o projeto, sob o fundamento de que a proposição “padece de vício de inconstitucionalidade e contraria o interesse público” (vide Veto nº 38/2023). Todavia, o Congresso Nacional rejeitou o veto presidencial em 14/12/2023, com 438 votos contrários e 91 favoráveis ao veto, dando origem à mencionada Lei nº 14.784/23.

Ocorre que, no dia em que foi publicada a Lei nº 14.784/23, a nova MP foi proposta pelo Poder Executivo, com o principal objetivo de reduzir o déficit fiscal. As modificações implementadas pela MP podem ser resumidas nos seguintes pontos:

  • Restabelecimento da contribuição previdenciária: revogada a CPRB, as empresas deverão, a partir de 01º/04/2024, voltar a contribuir sobre a folha de pagamento à alíquota de 20% (vinte por cento) de que tratam os incisos I e III do art. 22 da Lei nº 8.212/91;
  • Alíquotas reduzidas (e gradualmente restabelecidas) para setores específicos: com o objetivo de não sobrecarregar determinados setores, foram estabelecidas regras de desoneração parcial da contribuição previdenciária, com alíquotas que variarão de 10% (dez por cento) a 18,75% (dezoito inteiros e setenta e cinco centésimos por cento), gradativamente majoradas de 2024 até 2027;
  • Setores abrangidos pelas alíquotas reduzidas: os setores abrangidos pela redução temporária das alíquotas, cujos códigos da Classificação Nacional de Atividades Econômicas – CNAE foram listados nos Anexos I e II da MP, são os seguintes: transporte; tecnologia da informação e comunicação; calçados e couro; construção civil e engenharia; editorial e de comunicação; e de atividades de consultoria empresarial; 
  • Requisitos para enquadramento nos Anexos I e II: as empresas deverão considerar apenas o código da CNAE relativo à sua atividade principal (aquela de maior receita auferida ou esperada), bem como “deverão firmar termo no qual se comprometem a manter, em seus quadros funcionais, quantitativo de empregados igual ou superior ao verificado em 1º de janeiro de cada ano-calendário”. Mais do que isso, caso haja uma redução nos quadros funcionais, as empresas “não poderão usufruir do benefício de redução da alíquota, durante todo o ano-calendário”;
  • Limitação ao valor de 1 (um) salário-mínimo: as alíquotas mencionadas no item “b” serão restritas ao valor de 1 (um) salário-mínimo do salário de contribuição do segurado. Se a remuneração do segurado for superior a essa margem, aplica-se a alíquota integral de 20% (vinte por cento) sobre o valor que ultrapassar o limite de 1 (um) salário-mínimo;
  • Outras alterações não vinculadas à contribuição previdenciária: a MP promove, ainda, outras alterações na legislação tributária, revogando o benefício fiscal do Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (PERSE) e impondo restrições ao direito de compensação de créditos decorrentes de decisões judiciais; e
  • Produção de efeitos: a medida passa a produzir efeitos a partir de 01º/04/2024, considerada a anterioridade nonagesimal.

Em termos práticos, até abril de 2024, as empresas listadas nos Anexos I e II da MP precisarão: (1) firmar termo no qual se comprometem a manter, em seus quadros funcionais, quantitativo de empregados igual ou superior ao verificado em 1º de janeiro; (2) adequar a forma de cálculo de pagamento das contribuições previdenciárias de seus empregados, aplicando-se a alíquota minorada de 10% ou 15% (a depender da sua atividade) sobre o valor do salário-mínimo e a alíquota de 20% sobre os valores que excederem o salário-mínimo.

No que diz respeito à validade da nova MP, é importante mencionar que a constitucionalidade das alterações normativas já vem sendo questionada judicialmente, com o ajuizamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 7587 perante o Supremo Tribunal Federal (STF). Na referida ADI, alega-se, dentre outros fundamentos, a violação aos princípios democrático e à separação de poderes, pois a MP é contrária a tema aprovado pelo Congresso Nacional na mesma sessão legislativa. Questiona-se, ainda, a validade dos dispositivos relacionados à revogação do PERSE e às limitações à compensação. No momento, o pedido liminar formulado na ação está pendente de apreciação pelo Ministro Relator Cristiano Zanin.

Além disso, com a retomada dos trabalhos do Poder Legislativo em 05/02/2024, a MP está em tramitação no âmbito Legislativo. Até 07/02/2024, os parlamentares teriam prazo para apresentar emendas ao texto normativo, sendo que a MP entrará em regime de urgência em 18/03/2024, caso não seja apreciada pelo Congresso até essa data. É provável que a nova MP encontre certa resistência no âmbito legislativo, visto que o seu teor contraria recentes votações do Parlamento para aprovação da ora revogada Lei nº 14.784/23.

Há, portanto, um inegável cenário de incerteza a respeito da (des)oneração da folha de salários, que assumem diversas perspectivas: (1) no âmbito Legislativo, a MP poderá ser aprovada ou rejeitada pelo Congresso ou, caso não apreciada em até 120 dias, poderá perder eficácia; (2) no âmbito Judicial, a MP poderá ou não ser declarada inconstitucional pelo STF, ao julgar a ADI nº 7587; e (3) a despeito dessas incertezas, até 01º/04/2024, as empresas precisarão arcar com o pagamento da contribuição previdenciária à alíquota de 20% ou atender às novas exigências legais para aproveitar as alíquotas reduzidas, desenvolvendo a nova parametrização de pagamento de seus funcionários segurados.

Em vista dessas modificações normativas, das incertezas e dos desafios impostos para adequação à nova sistemática de recolhimento da contribuição previdenciária, é fundamental que os contribuintes estejam atentos às mudanças relativas à oneração da folha de pagamento, buscando orientação técnica e qualificada para verificar, caso a caso, a melhor forma de resguardar seus direitos – sobretudo, porque a MP nº 1.202/23 passará a produzir efeitos em 01°/04/2024.

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