GESTÃO PATRIMONIAL – ATIVOS IMOBILIÁRIOS – TRIBUTAÇÃO

Finalidade negocial dos imóveis impacta na tributação de pessoas físicas, jurídicas ou fundos
por Gustavo de Moraes Roehe publicado em 10/08/2023

O mercado de ativos imobiliários no Brasil costuma atrair a atenção de investidores que desejam aportar capital em investimentos com segurança e maior potencial de resultados. De modo geral, ativo imobiliário pode ser conceituado como um ativo financeiro relacionado ao mercado de imóveis. Esse conceito pode se referir ao bem específico, como um imóvel físico, mas também compreende outros investimentos do segmento, como títulos de crédito, cotas de fundos de investimento imobiliário e recebíveis de venda.

Diante de um mercado imobiliário com alto volume de investimento, é recomendável que o investidor tenha condições de analisar qual é a estrutura mais adequada para a gestão da sua carteira de ativos imobiliários.

Dessa forma, no presente artigo, serão abordados três veículos para gestão desses ativos no ordenamento jurídico brasileiro: pessoa física do investidor; pessoa jurídica constituída para fins de administração de ativos imobiliários (a chamada “holding imobiliária”); e o Fundo de Investimento Imobiliário (“FII”). É importante salientar que cada veículo ora analisado possui efeitos tributários e patrimoniais distintos. Em virtude disso, a opção por um ou outro decorre da finalidade negocial dos imóveis, conforme se verá adiante.

  1. Da pessoa física do investidor

A Lei nº 7.713/88 estabelece que a alienação de bens ou direitos de qualquer natureza constitui forma de rendimento bruto, denominado ganho de capital, sujeito à incidência do Imposto de Renda. Nesse sentido, o art. 3º, §2º, da referida lei, preconiza que o ganho de capital é a diferença positiva entre o valor de alienação do bem e o respectivo custo de aquisição, conforme art. 16.

Atualmente, o art. 21 da Lei nº 8.981/95 fixa as seguintes alíquotas de Imposto de Renda que incidirão sobre o ganho de capital percebido por pessoa física:

Base de Cálculo (R$)Alíquota (%)
Até 5.000.000,0015
De 5.000.000,01 até 10.000.000,0017,5
De 10.000.000,01 até 30.000.000,0020
Acima de 30.000.000,0022,5

Por sua vez, se os imóveis porventura forem locados pelo investidor pessoa física, os rendimentos decorrentes do aluguel devem ser declarados na Declaração de Imposto de Renda da Pessoa Física (“DIRPF”) e sujeitam-se à incidência do Imposto de Renda sob a sistemática da tabela progressiva, a qual obedece aos seguintes patamares, conforme inciso X do art. 1º da Lei nº 11.482, alterada pela Medida Provisória nº 1.171, de 2023:

Base de Cálculo (R$)Alíquota (%)Parcela a Deduzir do IR (R$)
Até 2.112,00zerozero
De 2.112,01 até 2.826,657,5158,40
De 2.826,66 até 3.751,0515370,40
De 3.751,06 até 4.664,6822,5651,73
Acima de 4.664,6827,5884,96
  • Da holding imobiliária

A segunda figura a ser analisada é a holding imobiliária, pessoa jurídica constituída para fins de administração e gestão dos ativos imobiliários do investidor. A rigor, essas sociedades empresárias poderão optar por apurar o lucro da atividade econômica desenvolvida pela sistemática do Lucro Presumido ou do Lucro Real, salvo algumas exceções de imposição obrigatória do Lucro Real.

No regime de apuração do Lucro Presumido, usualmente optado por estes veículos, a base de cálculo do IRPJ e da Contribuição sobre o Lucro Líquido (“CSLL”) será determinada, basicamente, pela soma de duas grandezas: uma determinada pela aplicação dos percentuais previstos nos arts. 15 e 20 da Lei nº 9.249, de 1995, sobre a receita bruta auferida pela pessoa jurídica, deduzida das devoluções, vendas canceladas e dos descontos incondicionais concedidos; e outra correspondente a receitas não-operacionais, como os ganhos de capital, por exemplo.

b.1) Das receitas de locação de ativos imobiliários

Para as receitas decorrentes da atividade imobiliária de administração, locação ou cessão de bens imóveis, que compõem a receita operacional da pessoa jurídica, a base de cálculo do IRPJ e da CSLL será calculada mediante a aplicação da alíquota de 32% sobre o total da receita bruta auferida, conforme estabelece o art. 15, § 1º, inciso III, e art. 20, inciso I, ambos da Lei nº 9.249/95.

Após o cálculo da presunção de lucro, aplica-se a alíquota de 15% à título de IRPJ, somando-se ainda a alíquota adicional de 10% sobre a faixa de lucro que exceder R$ 20.000,00 (vinte mil reais) por mês, nos termos do art. 3º, §1º, da Lei nº 9.249/95, e a alíquota de 9% referente à CSLL, nos termos do art. 3º, inciso III, da Lei nº 7.689/88.

Ademais, sobre a receita bruta auferida, incidirão as contribuições sociais PIS e COFINS na alíquota agregada de 3,65%, conforme previsto na Lei nº 9.718/98.

Supondo que determinado investidor mantenha 05 (cinco) imóveis destinados à locação e perceba uma remuneração de R$ 100.000,00 (cem mil reais) mensais, verifica-se a diferença entre o impacto fiscal sobre as receitas advindas do aluguel dos imóveis auferidas pela holding imobiliária optante do Lucro Presumido, e por pessoa física:

Impacto Tributário – Locação de imóveis
Holding imobiliária – Lucro PresumidoPessoa Física
Receitas mensais (R$) = 100.000,00Receitas mensais (R$) = 100.000,00
Base presumida de IRPJ/CSLL = 32.000,00Primeira faixa = isenta
IRPJ = 6.000,00Segunda faixa = 53,60
CSLL = 2.880,00Terceira faixa = 138,65
PIS = 650,00Quarta faixa = 205,56
COFINS = 3.000,00Quinta faixa = 26.217,21
Tributação mensal = 12.530,00Tributação mensal = 26.615,02

b.2) Das receitas de compra e venda de ativos imobiliários e o ganho de capital

No que diz respeito às receitas advindas de atividade imobiliária de compra e venda de imóveis próprios, que compõem a receita operacional da pessoa jurídica (Ativo Circulante), a base de cálculo do IRPJ será calculada mediante a aplicação do percentual de 8% sobre a receita bruta auferida, e a base presumida da CSLL será encontrada através da aplicação da alíquota de 12% sobre essa receita, nos termos do art. 15, e art. 20, inciso III, ambos da Lei nº 9.249/95. Esse o entendimento da Receita Federal do Brasil externado na Solução de Consulta – Cosit nº 7, de 04/03/2021, e na Solução de Consulta – Disit nº 4.028, de 28/07/2023.

Por outro lado, os ganhos de capital da pessoa jurídica tributada pelo Lucro Presumido não serão computados nas bases presumidas, conforme previsão do art. 25 da Lei nº 9.430/96, na medida em que não constituem receita operacional da pessoa jurídica. É dizer, portanto, que os ganhos de capital apurados decorrentes da alienação de bens ou direitos de qualquer natureza, classificados no Ativo Não Circulante, estão sujeitos à incidência de IRPJ e CSLL pela alíquota agregada de 34% acima mencionada – por outro lado, estão isentos do recolhimento da contribuição ao PIS e da COFINS, conforme disposição do art. 3º, §2º, inciso IV, da Lei nº 9.718/98.

A título comparativo, adotando o mesmo exemplo dos imóveis analisado anteriormente, e assumindo que o preço de venda desses bens seja de R$ 5.000.000,00 (cinco milhões de reais), demonstramos o impacto fiscal sobre a operação realizada pela holding com imóveis registrados no estoque (Ativo Circulante), no imobilizado (Ativo Não Circulante), e por pessoa física:

Impacto Tributário – Venda de imóveis (Holding – Ativo Circulante)
Receita de Venda de Imóveis (R$)5.000.000,00
Base Presumida de IRPJ400.000,00
Base Presumida de CSLL600.000,00
IRPJ98.000,00
CSLL54.000,00
PIS32.500,00
COFINS150.000,00
Total da Carga Tributária334.500,00
Impacto Tributário – Venda de imóveis (Holding – Ativo Não Circulante)
Receita de Venda de Imóveis (R$)5.000.000,00
Custo dos Imóveis Assumido(2.000.000,00)
Ganho de Capital e Base de IRPJ/CSLL3.000.000,00
IRPJ750.000,00
CSLL450.000,00
Total da Carga Tributária1.200.000,00
Impacto Tributário – Venda de imóveis (Pessoa Física)
Receita de Venda de Imóveis (R$)5.000.000,00
Custo dos Imóveis(2.000.000,00)
Ganho de Capital e Base de IRPF3.000.000,00
IRPF450.000,00
Total da Carga Tributária450.000,00
  • Do Fundo de Investimento Imobiliário (“FII”)

O FII foi instituído pela Lei nº 8.668/93, que estabelece que os fundos não possuem personalidade jurídica, e caracterizam-se pela comunhão de recursos captados por meio do Sistema de Distribuição de Valores Mobiliários, destinados à aplicação em empreendimentos imobiliários. 

Por sua vez, a Instrução CVM nº 472, de 31 de outubro de 2008 dispõe em seu art. 45, inciso I, que a participação do FII poderá se dar por meio da aquisição de quaisquer direitos reais sobre bens imóveis, dentre outros ativos imobiliários que não serão analisados por ora.

Dessa forma, o investidor detentor dos imóveis poderá integralizar os bens ao patrimônio do FII, que por sua vez procederá à emissão de cotas de valor equivalente aos imóveis integralizados em favor do investidor.

No que diz respeito à tributação do FII, o art. 16 da Lei nº 8.668/93 refere que os rendimentos e ganhos de capital auferidos pelos fundos ficam isentos do IOF, assim como do Imposto de Renda. É dizer, portanto, que as operações de locação e compra e venda com os imóveis integralizados ao patrimônio do FII não sofrem a incidência dos tributos aqui referidos, nem de CSLL, PIS e COFINS, na medida em que não são considerados pessoas jurídicas, na forma da lei.

Quanto à tributação dos cotistas do FII, o art. 17 da Lei nº 8.668/93 preconiza que os rendimentos e ganhos de capital auferidos, apurados segundo o regime de caixa, quando distribuídos pelos FII a qualquer beneficiário, sujeitam-se à incidência do imposto de renda na fonte, à alíquota de vinte por cento. Ainda, conforme determinação do parágrafo único do art. 10 do diploma legal, o FII deve distribuir a seus quotistas, no mínimo, 95% dos lucros auferidos.

Dessa forma, considerando que a estrutura do FII geralmente envolve valores mais altos para se viabilizar (dados os elevados custos de manutenção e gestão), o impacto tributário sobre as operações de locação e compra e venda de imóveis realizadas através da estrutura de um FII, em regra, assume a seguinte forma:

Impacto Tributário – Venda/Locação de imóveis (FII)
Receita de Venda/Locação (R$)30.000.000,00
IRPJ, CSLL, PIS, COFINS, IOFZero
Impacto Tributário – Distribuição de 95% dos Lucros à quotista (PF ou PJ)
Lucros auferidos (R$)28.500.000,00
IRRF5.700.000,00

Em comparação com o impacto tributário sobre a mesma operação, realizada pela estrutura de uma holding imobiliária e recebendo tratamento como ganho de capital, verifica-se a economia fiscal obtida através do FII:

Impacto Tributário – Venda de imóveis (Holding – Ativo Não Circulante)
Receita de Venda de Imóveis (R$)30.000.000,00
Custo dos Imóveis Assumido(10.000.000,00)
Ganho de Capital e Base de IRPJ/CSLL20.000.000,00
Total da Carga Tributária (IRPJ/CSLL)6.800.000,00

Portanto, a tributação do IRRF na estrutura do FII pode ser menos onerosa do que a tributação na pessoa jurídica, que incidiria à alíquota de 34% referente ao IRPJ/CSLL sobre o ganho de capital auferido na alienação dos ativos imobiliários.

d) Do FIAGRO

Um dos motivos que pode impedir a constituição da estrutura do FII para administração dos ativos imobiliários do investidor é a possibilidade do reconhecimento de ganho de capital na integralização dos imóveis ao patrimônio do fundo, conforme previsão do art. 12 da IN CVM nº 472/08.

Estabelece o referido dispositivo que “a integralização em bens e direitos deve ser feita com base em laudo de avaliação elaborado por empresa especializada”, o que conduz à conclusão de que os imóveis integralizados serão avaliados a valor de mercado, situação que pode gerar ganho de capital ao investidor, passível de tributação pelo imposto de renda.  

Diante disso, uma alternativa que se mostra viável para o investidor é a constituição de Fundo de Investimento nas Cadeias Produtivas do Agronegócio (FIAGRO), previsto no art. 20-A da Lei nº 8.668/93, constituídos sob a forma de condomínio aberto ou fechado para aplicação em imóveis rurais, dentre outros ativos relacionados ao agronegócio.

A tributação das operações realizadas pelo FIAGRO, bem como dos rendimentos e ganhos de capital distribuídos aos cotistas do fundo, segue a mesma regra das normas aplicáveis aos FII. Por sua vez, assim como no FII, as cotas dos FIAGRO podem ser integralizadas em bens e direitos como imóveis rurais, conforme previsão do art. 20-E da referida legislação, também sujeitos à avaliação por profissional ou por empresa especializada, nos termos do §3º desse artigo.

No entanto, o § 1º do referido dispositivo permite que o pagamento do imposto de renda decorrente do ganho de capital sobre as cotas integralizadas com imóvel rural por pessoa física ou jurídica seja diferido para a data definida de venda dessas cotas, ou por ocasião do seu resgate, no caso de liquidação dos fundos.

Desse modo, enquanto a transferência de ativos para o patrimônio do FII pode ensejar a tributação imediata sobre o ganho de capital, tal situação não se verifica no FIAGRO em relação a imóveis rurais, na medida em que a tributação sobre a integralização é diferida para o momento da alienação/resgate das cotas.

Autor:

Gustavo de Moraes Roehe (gustavo@charneski.com.br)

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