IRPJ/CSLL – JCP – RESERVA DE INCENTIVOS FISCAIS – CAPITALIZAÇÃO
IN RFB nº 2.201/24 inova, ao vedar exclusão da base dos JCP de reservas capitalizadas
por Heron Charneski publicado em 18/12/2024Uma pauta que movimentou intensamente este (já muito movimentado) ano tributário e se renova nesse período de encerramento de balanços está relacionada ao advento da Lei nº 14.789/23. De um lado, essa lei estabeleceu mudanças no tratamento tributário das subvenções para investimento pelas pessoas jurídicas tributadas pelo lucro real. De outro lado, restringiu para essas mesmas empresas algumas possibilidades legais de pagamento de juros sobre capital próprio (JCP).
Em síntese, enquanto no regime vigente até 31/12/2023 os contribuintes beneficiários de incentivos de ICMS caracterizados como “subvenções para investimento” podiam excluir esses valores das bases de cálculo do IRPJ (Imposto de Renda das Pessoas Jurídicas) e da CSLL (Contribuição Social sobre Lucro Líquido), desde que cumpridos determinados requisitos legais, com a Lei nº 14.789/23, a partir de 1º de janeiro de 2024, as pessoas jurídicas tributadas pelo lucro real deverão obrigatoriamente incluir nas bases de cálculo do IRPJ , da CSLL os benefícios fiscais na forma de subvenções recebidas da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.
Em contrapartida, a Lei nº 14.789/23 concede uma espécie de alívio parcial, mediante crédito fiscal correspondente à alíquota do IRPJ de 25%, às empresas habilitadas junto à Secretaria da Receita Federal do Brasil (RFB) que receberem subvenções para implantação ou expansão de empreendimentos econômicos.
Além disso, a Lei nº 14.789/23 alterou determinadas regras sobre a forma de apuração da base de cálculo dos JCP.
A distribuição dos JCP é uma forma de remuneração de acionistas, sócios ou cotistas, em razão do capital investido em uma sociedade empresária. Trata-se de uma alternativa à remuneração por meio de lucros e dividendos, pois esses são indedutíveis, ao passo que os valores distribuídos a título de JCP são dedutíveis das bases de cálculo do IRPJ e da CSLL na sistemática do lucro real, independentemente do tipo societário. Com isso, estimula-se a a capitalização das pessoas jurídicas e a isonomia de tratamento em relação à remuneração do capital por meio de empréstimos e financiamentos, cujos juros também são fiscalmente dedutíveis.
Pois bem, anteriormente à publicação da Lei nº 14.789/23, o art. 9º da Lei nº 9.249/95 definia que os JCP seriam calculados sobre as contas do patrimônio líquido, não havendo maiores restrições ao cálculo dos JCP na redação original do § 8º daquele dispositivo. Considerava-se, para tanto, o capital social, as reservas de capital e de lucros, as ações em tesouraria e os prejuízos acumulados.
Contudo, o art. 18 da Lei nº 14.789/23, sob a justificativa de supostamente “corrigir distorções, lacunas e artifícios contábeis” que podiam afetar o cálculo dos JCP, modificou a composição da respectiva base de cálculo e introduziu novos limites para a apuração desse mecanismo remuneratório.
Assim, passa-se a considerar, como base de cálculo dos JCP a partir de 01º/01/2024:
- apenas o capital social integralizado;
- as reservas de capital formadas a partir da subscrição de ações que ultrapassar o valor nominal, e o preço de emissão de ações sem valor nominal, de modo que as demais reservas de capital não serão mais computadas no cálculo;
- as reservas de lucro, excluindo-se a reserva de incentivo fiscal; e
- os lucros ou prejuízos acumulados – e não mais só os prejuízos acumulados.
Além disso, conforme o § 8º-A do mencionado art. 9º da Lei nº 9.249/95 incluído pela Lei nº 14.789/23, na base de cálculo dos JCP: a) não devem ser consideradas as variações positivas no patrimônio líquido que decorram de atos societários realizados entre partes dependentes que não envolvam efetivo ingresso de ativos, com aumento patrimonial em caráter definitivo; bem como b) devem ser considerados lançamentos contábeis redutores realizados em rubricas de patrimônio líquido, quando esses lançamentos decorrerem dos mesmos fatos que deram origem a lançamentos contábeis positivos.
Com efeito, quanto ao tema em estudo, diante de um cenário de insatisfação do governo federal com o que considera “benefícios fiscais” (a não-tributação dos incentivos fiscais e a remuneração via JCP), a Lei nº 14.789/23 veio dispor que não seriam consideradas como base de remuneração do JCP, dentro das contas do patrimônio líquido, a reserva de incentivos fiscais prevista no art. 195-A da Lei das S.A. como forma de reter na empresa os resultados relacionados à contabilização desses incentivos.
A Lei nº 11.638/2007 havia revogado a alínea “d” do § 1º do art. 182 da Lei nº 6.404/1976, que remetia a contabilização das doações e subvenções para investimento ao patrimônio líquido, em conta de reserva, e introduziu com o art. 195-A da Lei nº 6.404/1976 a “Reserva de Incentivos Fiscais”.
Indicou-se, pois, que, a partir dali, as subvenções passariam a transitar pelo resultado do exercício, uma vez que consideradas como parcela do lucro líquido a ser destinada à então recém criada Reserva de Incentivos Fiscais, para evitar o seu cômputo na base de cálculo dos dividendos mínimos obrigatórios.
Publicada em 22/07/2024, a IN RFB nº 2.201/24 dispôs, dentre outros temas, sobre a atualização das normas de dedutibilidade fiscal dos JCP, à vista das atualizações da Lei nº 14.789/23.
A despeito de a Lei nº 14.789/23 manter o cálculo dos JCP tendo como base o valor do “capital social integralizado” e as “reservas de lucros”, vedando apenas a inclusão nesse cômputo da “reserva de incentivo fiscal de que trata o art. 195-A da Lei das S.A., a Instrução Normativa RFB nº 2.201/24 ampliou a restrição, ao prever que não poderá ser considerada no cálculo dos JCP a reserva de incentivo fiscal composta pela destinação do lucro líquido, mas também “as parcelas que tiverem sido destinadas ao capital social e à reserva de capital” (art. 75, § 1º, V, inserido na IN RFB nº 1.700/17).
Em outros termos, enquanto a Lei nº 14.789/23 excluiu do cômputo da base de cálculo dos JCP apenas a reserva de incentivo fiscal, composta pela destinação do lucro líquido do exercício na forma da lei societária, a IN RFB nº 2.201/24 excluiu da base dos JCP também a eventual parcela da reserva de incentivo fiscal que eventualmente tenha sido capitalizada ou integralizada ao capital social.
Lembrando, a própria Lei nº 14.789/23, no art. 16, havia permitido que os valores registrados na reserva de incentivo fiscal, como requisito à não tributação pelo IRPJ e pela CSLL (art. 30 da Lei nº 12.973/14), poderia ser utilizada para absorção de prejuízos ou aumento do capital social.
Dessa forma, a nossa ver, constituindo os JCP uma forma de remuneração do custo do capital de sócios e acionistas, a ausência de restrição expressa na lei acerca de quais parcelas do “capital social integralizado” poderiam ser consideradas na base de cálculo dos JCP significa que a IN RFB nº 2.220/24 inovou ilegalmente, ao destacar a parcela da reserva de incentivo fiscal capitalizada do cálculo dos limites de dedutibilidade fiscal.
A capitalização da reserva de incentivo fiscal existente até 31/12/2023 é não apenas uma previsão da própria Lei nº 14.789/23, como uma destinação lógica dos recursos acumulados com subvenções para investimentos, até as alterações vigentes em 2024.
Assim, é fundamental que os contribuintes estejam atentos ao novo regime tributário dos incentivos fiscais e à nova forma de cálculo dos JCP trazida pela Lei nº 14.789/23, buscando orientação técnica e qualificada para verificar, caso a caso, a melhor forma de resguardar seus direitos, sobretudo em face dos balanços a serem encerrados em 31/12/2024.
Autor:
Heron Charneski (heron@charneski.com.br)